“A sociedade civil de Piracicaba precisa ser ouvida pelo poder público”, afirmam líderes de grupos
Claudia Assencio e Rafael Bitencourt
O MobCidades – Mobilidade, Orçamento e Direitos, é um projeto da ONG Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos), de Brasília, que reúne dez instituições, selecionadas para conduzir o projeto em dez cidades. Entre essas instituições, está o Observatório Cidadão que, para implantação do projeto, articulou-se com outras quatro instituições de Piracicaba, que foram entrevistadas. São elas: Observatório Social de Piracicaba (OSP), Promotoras Legais Populares (PLPs), Associação de Moradores do Distrito de Tupi e Conselho Municipal de Proteção, Direitos e Desenvolvimento da Pessoa com Deficiência.
Um anseio se mostrou recorrente entre os entrevistados, o de que a sociedade seja ouvida por seus governantes. Para isso, ressaltam a importância de uma sociedade civil organizada. Abaixo, você confere as análises, as reivindicações e como essas instituições atuam no MobCidades. Para ler as perguntas e respostas na íntegra, basta clicar nos nomes de cada instituição.
Roberto Borges é presidente do Observatório Social de Piracicaba (OSP), entidade não-partidária, composta por 15 profissionais voluntários, que atuam na fiscalização de licitações do Executivo, Legislativo e de autarquias, como o Serviço Municipal de Água e Esgoto (Semae). Com menos de dois anos de existência, a organização já verificou inadequações em editais de obras de mobilidade urbana, das reformas de terminais de ônibus, acompanhou processo de licitação do Hospital Regional, que iniciou funcionamento em março de 2018, após constantes atrasos, e denunciou ao Ministério Público (MP) superfaturamentos em certame da Secretaria Municipal de Educação.
FOTO DE ROBERTO BORGES – OBSERVATÓRIO SOCIAL DE PIRACICABA
Sobre os problemas encontrados em licitações municipais, Borges afirma que o principal é falta de fiscalização e aponta as obras de recapeamento de vias como um dos exemplos disso. “Digamos que o fiscal passe, pela manhã no início dos serviços, momento em que trabalhador ainda limpa a rua para a remoção do asfalto velho. Quando ele retorna, no final do dia, só consegue ver a nova pavimentação já pronta. Não há como checar se todas as normas de qualidade foram seguidas – existem regras para colocação das camadas do asfalto. Sem a realização adequada, ele dura poucos meses”, adverte. Além da fiscalização constante, Borges sugere a existência de um “rigoroso recebedor final do serviço ou de material”, uma espécie de fiscal exigente. “Essa é a chave do negócio”, diz.
Borges ainda avaliou os gastos públicos de Piracicaba e criticou a sociedade civil pela baixa participação em audiências que tratam de temas fundamentais como orçamento e o plano diretor do município. “O comportamento da sociedade civil precisa mudar. Devemos acordar! Precisamos mudar a forma de reivindicar. São muitas vozes separadas, alheias, assim não vamos conseguir. Temos que uni-las e dizer o que queremos, não importa a qual movimento o cidadão pertença. Isso se faz quando lotamos as audiências públicas para sermos ouvidos. Enquanto houver meia-dúzia de pessoas, não vai ocorrer”, ressalta. Ele esclarece que leis específicas garantem acesso a informações e até permitem suspender licitações, não por instituições, mas por qualquer cidadão.
FOTO DE CLAUDIA REGONHA SUSTER – PROMOTORAS LEGAIS DE PIRACICABA
As Promotoras Legais Populares (PLPs) levam a discussão de gênero para o centro do debate sobre mobilidade urbana no projeto MobCidades. “Nós reconhecemos que, para as mulheres, em especial àquelas que utilizam os transportes públicos coletivos, há uma exposição muito maior à violência do que se comparado aos homens”, afirma Claudia Regonha Suster, representante do coletivo PLPs na cidade. “É recorrente o relato de mulheres que sofrem situações de assédio dentro dos ônibus ou quando precisam ficar nos pontos de ônibus, em lugares isolados. Nesse sentido, o próprio uso do transporte difere significativamente quando você é um homem ou quando você é uma mulher”, completa.
O coletivo Promotoras Legais Populares atua no Brasil há mais de duas décadas, tendo como atividade norteadora o oferecimento de um curso de educação popular em direitos humanos para mulheres. Nos encontros, segundo Claudia, são abordados temas como violência, gênero, sistema de garantia de direitos e história do feminismo. “No caso de Piracicaba, especialmente, discutimos questões relativas à vida das mulheres e à necessidade de implantação de políticas públicas para nossa proteção”, explica.
Em 2018, as PLPs esperam, do poder público, a implantação da Casa Abrigo para vítimas de violência e apontam as consequências de mudanças no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) para a vida das mulheres. “O fechamento dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e a terceirização desses equipamentos, assim como do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), implica em impacto direto na vida das mulheres, considerando que um número expressivo delas são arrimos de famílias”, lamenta.
FOTO DO CARLOS SILVA, O CHITÃO, DA ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DO DISTRITO DO TUPI
“O MobCidades veio para mostrar os problemas do transporte que a nossa cidade enfrenta”, disse Carlos Silva, o "Chitão", da Associação de Moradores do Distrito de Tupi de Piracicaba. Aposentado, ele mora na região desde 1979 e conhece bem as demandas do local. A organização, representada nesta série de reportagens pela pessoa de Silva, é um exemplo de como é possível lutar por melhorias de forma coletiva e organizada e como o conhecimento das leis, dos mecanismos de políticas públicas fazem toda diferença na hora de reivindicar direitos e na cobrança de gestões públicas mais transparentes.
A Associação, que atua em parceria com o Observatório Cidadão de Piracicaba no levantamento de dados sobre o Distrito, realizou um censo populacional da região, conseguiu melhorias nas áreas da Saúde e Lazer e, em audiência pública, impediu a municipalização de uma estrada que dá acesso ao bairro, procedimento que segundo ele, tinha como objetivo maior a especulação imobiliária.
“Nunca pensei em sair do meu bairro em busca de um lugar melhor. A ideia é melhorar as condições para quem vive nele”. Para Chitão, a sociedade civil, quando organizada, tem mais força para conquistar suas reivindicações. Em 2018, o representante de bairro espera que os governantes ouçam mais as comunidades.
FOTO DO CHICO PIRATA, REPRESENTANTE DA SOCIEDADE CIVIL NO COMDEF DE PIRACICABA
Francisco Nuncio Cerignoni é membro do Conselho Municipal da Proteção, Direitos e Desenvolvimento da Pessoa com Deficiência (Comdef) de Piracicaba, que tem como objetivo zelar pela implantação de políticas públicas quanto à acessibilidade de pessoas com deficiência e mobilidade reduzida, tal como acompanhar o planejamento e avaliar a execução de tais políticas. Ele espera que, em 2018, o Plano Municipal de Mobilidade Urbana seja criado, com metas definidas e claras. “E partir de 2019, possam constar recursos suficientes no orçamento para executar as obras que facilitem as vidas das pessoas com deficiência e com mobilidade reduzida”, afirma. “Nossa preocupação maior são os obstáculos que encontramos para que as pessoas se movimentem pela cidade”, ressalta.
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